DIÁLOGOS NO CEM - Infância migrante e desafios para a sua proteção. 21-03-25 -- 14h
O número de crianças desacompanhadas que migram por vários pontos da América Latina e do Caribe atingiu níveis recordes, de acordo com estimativas do UNICEF.
Somente nos primeiros dez meses de 2024, 3.800 crianças fizeram a perigosa jornada através do Darien Gap entre a Colômbia e o Panamá, em comparação com menos de 3.300 registradas em todo o ano de 2023. Para o sul, tendências semelhantes são registradas. Uma média de 312 crianças desacompanhadas e separadas das famílias chegam mensalmente ao Brasil. O UNICEF identificou mais de 3.100 crianças nessa situação de janeiro a outubro de 2024.
As crianças agora representam um em cada quatro migrantes na América Latina e no Caribe, o que se soma ao deslocamento interno, à violência armada e às crises climáticas.
1.?Contextualização sobre crianças e adolescentes em situação de deslocamento forçado (migração forçada e refúgio)
Dentre as crianças e adolescentes em situação de deslocamento forçado, aquelas que se deslocam desacompanhadas ou separadas dos seus pais e responsáveis legais estão particularmente mais expostas a riscos, violações de direitos e diferentes formas de violência, tanto durante o percurso migratório, quanto no país de origem e país de destino. Para além dos movimentos migratórios forçados, crianças e adolescentes também podem encontrar-se sozinhas/os ou separadas/os dos seus pais e familiares, em consequência de diferentes tipos de emergências humanitárias, como enchentes, deslizamentos, instabilidades político-institucionais e conflitos armados.
Crianças e adolescentes deslocam-se por diversos motivos: em busca de atividades geradoras de renda, educação ou para se reunirem com suas famílias; e, em muitos casos, para fugir de situações de violência em seu local de residência habitual, incluindo violência física, psicológica, sexual, dentre outras. Atualmente, no mundo, existe uma lacuna de dados desagregados por gênero e idade sobre crianças e adolescentes desacompanhadas ou separadas.
No Brasil, a Defensoria Pública da União (DPU) realiza, a partir dos atendimentos em Pacaraima/RR, a coleta de dados acerca do perfil migratório de crianças e adolescentes venezuelanas/os1. Já um estudo elaborado pelo UNICEF2 aponta que há uma tendência crescente no número de crianças e adolescentes crianças e adolescentes desacompanhados/as, separados/as ou indocumentados/ as em mobilidade, e que, frequentemente, estes deslocamentos se dão por perigosas rotas migratórias. Estas crianças e adolescentes, por vezes, não são identificados/as nas fronteiras e territórios, por órgãos nacionais e outras entidades, pelas mais diversas razões, porque:
viajam escondidos/as com outras famílias ou grupos;
estão em uniões maritais precoces;
identificam-se como maiores de 18 anos;
escolhem rotas em que não haja controle de migração ou;
são vítimas de tráfico de pessoas, entre outras.
2.?Contextualização e definições sobre crianças e adolescentes desacompanhadas/os, separadas/ os e/ou indocumentadas/os
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), considera-se criança a pessoa até 12 (doze) anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos de idade. Entretanto, neste documento, quando se faz referência a “crianças desacompanhas, separadas e indocumentadas”, estão também incluídos os adolescentes. Conforme o Parecer Consultivo da Corte Interamericana de Direitos Humanos (OC-21/14 de 19 de agosto de 2014), temos a seguinte definição:
Crianças e adolescentes separadas/os são aquelas/ es que foram separadas/os de ambos os pais, ou de seus cuidadores legais ou costumeiros, mas não necessariamente de outros familiares. Deve incluir, portanto, crianças acompanhadas por outros adultos da família.
Crianças e adolescentes desacompanhadas/os são aquelas/es que foram separadas de ambos os pais e outros familiares e não estão sendo cuidados por um adulto que, por lei ou costume, é responsável por este cuidado.
No entanto, é comum, especialmente em regiões de fronteiras terrestres, que crianças e adolescentes estejam sem documentação que comprove sua identidade e filiação, tornando mais difícil a tarefa de caracterização da criança ou adolescente enquanto separada ou desacompanhada. Nesse sentido, a partir da experiência acumulada na resposta à situação de pessoas refugiadas e migrantes da Venezuela, entende-se importante ressaltar a seguinte conceituação para crianças e adolescentes indocumentadas/os:
Crianças e adolescentes indocumentadas/os são aquelas/es que não possuem nenhuma documentação válida comprobatória de sua identidade ou filiação, independentemente de estar acompanhada/o, separada/o ou desacompanhada/o. Geralmente, são aquelas/es que chegam ao país de destino sem portar documentos do país de origem, impossibilitando a verificação de vínculos familiares e de sua data e local de nascimento. A ausência de documentação é um sinal de alerta para possíveis situações de tráfico de pessoas e de adoções ilegais, motivo pelo qual o tema requer atenção especializada. A criança que entra no território indocumentada possui direitos assegurados, independentemente de portar documentos do país de origem .
Também merece especial atenção a situação de crianças e adolescentes em que, embora documentados/as, não seja possível verificar a filiação ou vínculo familiar por ausência de documentação dos seus pais/mães ou acompanhantes. Tal situação é objeto de proteção pelo art. 1º, §4º, da Resolução CONANDA nº 232, de 28 de dezembro de 2022.
Guia UASC - Proteção de Crianças e Adolescentes Desacompanhadas/os, Separadas/os e Indocumentadas/os no Brasil
UNICEF Brasil, Novembro de 2023